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terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Interesses políticos e econômicos na Tunísia colocam França na berlinda



Uma antiga potência colonial não deveria “emitir julgamentos” sobre a política interna dos países que ocupou no passado. É dessa forma que o presidente Nicolas Sarkozy tentou justificar, há poucos dias, o silêncio da França em relação à revolta popular na Tunísia. A demora do chefe de Estado em adotar uma posição clara, mesmo após a queda de Zein-al-Abidin Ben Ali, mostra que a classe política francesa sempre foi bastante próxima do regime do ex-ditador.

O argumento principal de Paris é que a abertura em termos, por exemplo, dos direitos das mulheres e o dinamismo econômico, compensam a falta de liberdade política. O ex-presidente Jacques Chirac (1995-2007) resumiu em 2003 esta tese, durante uma visita à nação árabe: “o primeiro dentre os direitos humanos é o direito à comida (…) Desse ponto de vista, é preciso reconhecer que a Tunísia está muita à frente de outros países”.

Além das relações políticas, a França mantém fortes laços econômicos com a antiga colônia. Segundo o jornal Politis, Paris é o primeiro investidor estrangeiro na Tunísia. Em 2008, mais de 280 milhões de euros foram investidos, enquanto 1,2 milhão de turistas franceses passaram férias no país. São 1.207 empresas francesas instaladas na Tunísia empregando 108 mil pessoas. Essas empresas estão presentes principalmente no setor têxtil, eletrônico (Sagem), turístico (resorts e spas) e de serviços, como os call centers.

Um bom exemplo da mistura entre interesse privado do regime de Ben Ali e das empresas francesas é a operadora de celular Orange Tunisie. A France Télécom/Orange é proprietária de 49% das ações do grupo e os outros 51% são propriedades da Investec, sociedade tunisiana de Marwan Mabrouk, genro do ex-presidente Ben Ali. É também o caso dos grupos de supermercados Casino e Monoprix, além da cadeia de lojas Galerias Lafayette.

África Subsaariana

No entanto, não é na Tunísia e no Egito, hoje foco mundial das atenções, que é possível encontrar os casos de intervenção francesa mais fortes. Os mais flagrantes estão nas ex-colônias subsaarianas da África.  A ONG Survie organiza desde 1985 campanhas de informação e interpela cidadãos e políticos para reformar a política da França no continente africano. Eles ajudaram a popularizar o termo “Françafrique”, nome dado pelas ONG francesas à influência exacerbada dos interesses econômicos e políticos franceses em alguns governos de países africanos.

Apesar de serem independentes há 50 anos, esses países ainda vivem sob a influência da “metrópole”. “Essas relações de dependência entre a França e esses países ainda devem continuar por muito tempo, porque a principal prioridade são os interesses estratégicos e econômicos e não os valores de democracia universal”, afirmou a ONG Survie em comunicado.

A Costa do Marfim, principal produtor de cacau do mundo, tem 600 empresas francesas instaladas, dentre elas, os principais grupos econômicos franceses conhecidos pelos africanos. O grupo Bolloré ganhou a concessão para explorar o Porto de Abidjan. Outro nome de peso na lista é a empresa Bouygues, responsável por toda construção de estradas e infraestrutura em vários países do continente. As empresas Bolloré se enriqueceram com as florestas em Camarões, principais fontes de matéria-prima para o papel produzido pelo grupo.

A influência francesa é ainda maior em países como o Níger, onde a exploração do urânio é realizada pela transnacional francesa Areva. A importância da exploração é vital para França, pois é o urânio do Níger que alimenta os reatores de suas usinas nucleares. Para garantir que essa produção não sofra nenhum tipo de ataque, a França assegura uma presença militar forte.

O caso do Gabão também é bem flagrante, durante 52 anos o presidente-ditador Omar Bongo reinou com apoio de todos os governos franceses. Depois de sua morte, o cargo de presidente é ocupado pelo filho, Ali Bongo Ondimba. O Gabão é o principal fornecedor de petróleo para a França e é a empresa Total que garante a exploração.

Fonte: Opera Mundi
Por:  Erika Campelo

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